2013-12-28

POSSE II

~Atenção~


Enquanto ficava navegando aleatoriamente em perfis de estranhos no Facebook, uma pessoa lhe chamou no chat:
"Ei, vc ta ai?"
"Estou, o que você quer?
"Quero... companhia"
"Ok. Chego aí em 10 minutos"

E assim pegou o carro e foi até a casa de sua amiga necessitada. Uma amiga problemática que já tinha até tentando se matar antes. Era a única pessoa em que ela confiava, e a usava para contar todos os seus problemas, suas desilusões amorosas e sua dificuldade em manter o peso. Sinceramente? Preferia que ela tivesse morrido mesmo.
O que não  entrava em sua cabeça era como alguém poderia viver das sobras dos outros. Viver nas sombras das pessoas. Não dar o melhor de si e mesmo assim por a culpa no mundo.
Isso a enojava.

Quando chegou na casa da amiga, nem mesmo bateu na porta e ela já a recebeu toda saltitante:
"Oiie Maria!! Você chegou rápido!"
"Olá Glória. Eu já disse que não gosto que você me chame assim"
"Perdão... Quer que eu te chame do que então?"
"A partir de hoje... você não vai me chamar de mais nada"
E subitamente, acertou a cabeça da Glória com um bastão. Mas diferente dos filmes, ela não desmaiou, apenas caiu no chão se contorcendo em dor. "Melhor assim. Prefiro que veja o que vou fazer com ela" Pensou.

Enquanto ficava navegando aleatoriamente em perfis de desconhecidos no Facebook, ela percebia que todos só queriam chamar Atenção. Seja por seus méritos, seja por seus fracassos. Seja pra mostrar as festas maravilhosas que tinham ido, seja pra mostrar o fim de semana depressivo na frente do computador. Todos estão carentes! Carentes por afeto, por amor, por ódio e principalmente por Atenção.

Quando Glória acordou sem entender o que estava acontecendo, se viu amarrada em uma cama num quarto escuro e vazio. Ficou desesperada e começou a gritar por socorro:
"Socorro! Alguém me ajude! Maria...? Não tem graça! Me solta daqui!!"
"Eu... já disse que odeio... ESSE NOME!" Gritou enquanto pegava uma corda e começou a estrangular Glória.
Enquanto Glória morria lentamente, viu no reflexo dos seus olhos a imagem da perfeita calma. Não sentia nada em matar uma amiga. Na verdade estava fazendo um favor para ela mesmo.
Mas então algo lhe ocorreu. Por que acabar com aquilo tão rápido? E todos os anos aguentando as reclamações dela? E quantas vezes tendo que ver sua amiga se cortando e mostrando as fotos para todos verem? Ela não gosta de Dor? Então eu vou lhe dar Dor!
Soltou a corda do pescoço de Glória, e sussurrou em seu ouvido:
"Você sempre quis morrer mas nunca teve competência para tanto. Eu vou lhe dar o que você quer, no futuro. Mas enquanto isso você é toda Minha! Meu objeto! Meu animalzinho de estimação! Minha para amar e odiar! E.... se se comportar bem, no final.... eu te livro dessa Dor.
Porque eu sou Aquilo que você nunca vai ser. Eu sou a Coragem que você não tem! Eu sou a Apatia que você sempre quis ter. Eu sou o Meio e o Fim! E acima de tudo... eu sou a tua Amiga. E Amigas devem cuidar umas das outras, não ;)"
~

2013-12-23

POSSE I

"Segue os relatos que escrevo sobre uma vida tenebrosa que eu tive. Aonde não sabia o que era o Sol, não conhecia o Carinho e a Felicidade era inexistente.
Mesmo eu sabendo que provavelmente ninguém ira conseguir ler isso a tempo, deixo aqui toda a minha dor."
-Diário de Glória.
30 dias antes de ser capturada.
Tentou se matar 2 vezes.

~GLORIA~


Acordei de forma súbita, como sempre acordava. O cheiro de podridão, sempre presente, era difícil de se acostumar. Mesmo que dias tivessem passado, eu não tinha mais noção do tempo. Quando você não tem que acordar cedo pra ir pra escola ou escutar a voz gentil da tua mãe falando pra se levantar cedo para aproveitar o domingo, não existe mais medida para o tempo.
Eu estava morrendo de tédio E medo. O medo só durava até que ela me causasse dor. E nos momentos de dor eu encontrava Esperança. Esperança de que tudo pudesse acabar naquele momento. Mas não acabava.
Ela ainda continua me agredindo. Continuava me punindo por coisas que eu nunca fiz. Ela era Doente, precisava de ajuda. Ela estava Sozinha e ela era minha Amiga.

Ela era a minha Amiga ha muito anos, mas eu não conseguia mais lembrar o seu nome. Na verdade eu não conseguia mais lembrar o meu próprio. Seria Fernanda? Amanda? Não... Acho que era Glória. Sim! Esse seria um nome bonito de se ter.
E como eu deveria chamar a minha captora? Uma vez chamei ela de Maria e ela apenas sorriu e me bateu no rosto. Depois cortou um pedaço da minha língua e desde então eu nunca mais falei uma palavra.
Não tenho raiva dela.

Eu comia uma vez por dia. Geralmente alguma fruta podre ou um pedaço de pão embolorado. Ela dizia que eu não deveria engordar pra não ficar feia.
Amigas cuidam uma das outras, não é mesmo?

Hoje ela não me bateu nenhuma vez. Apenas ficou me abraçando por horas e chorando. Preferia ter apanhado.

Finalmente eu consegui ver o sol. Foi tão bonito! Fiquei olhando até os meus olhos arderem. Ela viu a cena e furou um dos meus olhos. "Não almeje a luz quando você só pode ter a noite!" Ela disse.
Não tenho raiva dela.

As vezes eu conseguia ouvir uma música. Tão melancólica quanto os meus dias aqui presa. Sua melodia suave se tornou a minha trilha sonora aqui. Algo tão bela confinada dentro de um quarto escuro enquanto conta os dias para o inevitável. 
Ela viu que eu estava contando e cortou um dos meus dedos.
Não tenho raiva dela.

Hoje ela veio com um olhar vazio em seus olhos, disse algumas palavras que eu não pude ouvir, e finalmente me libertou.
Enfiou uma faca em meu peito e começou a chorar.
Enquanto o sangue se esvaia do meu corpo, eu pude ver que ela trazia outra garota para o quarto. Eu estava sendo substituída.
Eu tenho raiva dela.
~




2013-12-07

2004

A toda hora eu morro de uma maneira diferente.
A todo momento me vejo vivendo no mesmo inferno.
Sempre caindo no mesmo abismo

Paredes retorcidas e quebradas rodeiam todo o lugar.
Sombras frias, mas existem as quentes?
Como não ser contagiado por tanta imundice?

A toda hora eu morro de uma maneira diferente.
A todo momento me vejo entrando no mesmo inferno.
Tentando subir o mesmo penhasco.

Mãos cortadas, tudo está quebrado. Os cortes doem menos do que isso.
Os machucados sangram menos do que isso.
Minha alma está sangrando...

Minha alma está chorando e perdida em algum lugar entre o inferno e minha casa.
Minha alma está confusa e com ódio de tudo o que se passa entre o inferno e minha casa.

A toda hora eu morro respirando essa ar poluído.
Escutando essas malditas palavras da tua boca.
Sempre indo em direção ao nada...

*Escrito na virada do ano de 2004.
O que diabos eu tinha na cabeça?*